A Otite Média é uma doença extremamente comum na primeira infância. Quase 100% das crianças de três anos de vida tem apresentado pelo menos um episódio de Otite Média (OM) – mesmo que ele não tenha sido diagnosticada. Apesar de ser muito comum, a OM gera poucas ou raras complicações nas crianças.
Ela é causado por uma infecção na orelha média – parte do ouvido responsável pela aspecto mecânico da audição, através da movimentação da membrana timpânica (MT) e dos ossículos. A principal causa da OM está relacionada a Tuba Auditiva (TA), que na criança apresenta três características em relação ao adulto, que predispõem a ascensão de germes nasofaringe – como na imagem ao lado -para a orelha média:
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Associado a maior facilidade de acesso dos germes (vírus e bactérias), a criança ainda apresenta maior número de infecções de via aérea superior, menor eficácia nos mecanismos de drenagem de secreções (não sabe excretar secreções, assoar o nariz e etc) e imunidade ainda em fase de aprendizado.
Esses mesmos fatores são revertidos com o aumento da idade, e por isso a OM torna-se rara em maiores de 5 anos de idade. Mesmo assim, a OM continua sendo a principal causa do uso de antibióticos nos menores de 2 anos de idade.
A Otite Média é dividida em:
- Otite Média Aguda (OMA) – quadro abrupto que é o mais comum;
- Otite Média Supurada (OMS) – quando ocorre perfuração da Membrana Timpânica após uma OM;
- Otite Média Crônica – quadro de longa duração, sendo obrigatório o acompanhamento pelo Otorrinolaringologista.
Por muitos anos, a recorrência/ocorrência de um OMA, era considerado um sintoma de Refluxo Gastroesofágico (RGE), sendo coincidentemente o tratamento com ATB iniciado para RGE. Esse mesmo erro também ocorreu por muitos, relacionando a suposta associação entre OMA e quadros alérgicos – como a Rinite Alérgica, ou com aumento de amígdalas, adenóides, popularmente chamadas como carnes esponjosas. Hoje em dia sabemos que não existe nenhuma relação entre a ocorrência de OMA, RGE, alergias ou “carnes esponjosas”.
Quando Suspeitar?
Febre e dor no ouvido: com no máximo 48 horas de distância entre o início de cada um desses sintomas – que serão descritos abaixo – ou seja, se a dor no ouvido e a febre não ocorrerem próximas é pouco provável que seja infecção de ouvido.
Saída de secreção pelo canal do ouvido: sem infecção na pele, como ocorre na OMS.
Existe uma Escala de Sintomas (AOM-SOS) muito simples, podendo serem feitas pelos próprios pais, e quanto maior a pontuação, mais importante os sintomas, a probabilidade de se tratar de uma OMA aumenta:
- Manipulação ou dor na orelha;
- Choro Excessivo;
- Irritabilidade;
- Redução nas atividades;
- Alteração do Sono;
- Alteração do Apetite;
- Febre (maior ou menor que 39ºC).
Os outros sintomas são meramente relacionados ao quadro infeccioso encoberto, como: coriza, diarreia, dor no corpo, mal estar, entre outros, podendo estar relacionados às complicações: melhora da dor com saída de secreção da orelha (OMS), inchaço atrás da orelha – associado a orelha de abano e alterações neurológicas como convulsões – fraqueza muscular localizada ou dor de cabeça intensa.
Não confunda a OMA com a Otite Externa (OE), que também apresenta dor intensa na orelha, mas não ocorre febre ou qualquer um dos outros sintomas citados acima, sendo extremamente relacionado aos banhos nos bebês pequenos e a piscina nas crianças maiores.
O diagnóstico definitivo depende da visualização do pediatra experiente mediante a membrana timpânica, devido a sutil diferença entre uma membrana alterada por OMA e por OME. É uma alteração na drenagem normal – relacionada geralmente à gripes ou resfriados – da orelha média correspondente a uma obstrução da TA ou uma sequela temporária após uma OMA. Até 25% das crianças ainda apresentam OME após 3 meses da ocorrência de uma OMA.
Se seu filho já foi tratado inúmeras vezes de OMA em menos de 3 meses é bem provável que ele apresente apenas OME temporária e não precisaria da maioria dos antibióticos.
– Primeira foto: MT normal
– Foto 1: MT avermelhada por febre, exercício, tosse ou vômitos
– Fotos 2 e 3: MEE, pois não existe infecção associada
– Fotos 4 e 5: OME, observe que a MT está esbranquiçada sem abaulamento
– Fotos 6 a 7: OMA verdadeira. Observe como a MT está abaulada.
Na criança, a visualização da MT por completo é dificultada pelo diâmetro do canal auricular, falta de cooperação da criança e presença de cera, levando muitos pediatras a realizarem o diagnóstico de OMA sem a completa visualização da MT, e portanto sem conseguir diferenciar uma OMA, OME ou uma simples MEE.
O único prejudicado nessa situação é o seu filho, pois irá tomar antibióticos (ATB) sem necessidade, aumentando a possibilidade dela desenvolver germes resistentes aos ATB mais comuns, e doenças mais graves consequentemente.
Tratamento
O tratamento da OMA foi evoluindo com o avanço da medicina. Em 2013 a Academia Americana de Pediatria publicou o mais recente consenso, com o objetivo de reduzir a utilização de ATB em até 65% dos casos de OMA. O tratamento é dividido por idade e gravidade.
Essa redução durante a aplicação foi possível devido a descoberta que os germes causadores da OMA são:
- 66% associação entre vírus e bactérias;
- 27% bactérias sozinhas;
- 4% vírus sozinhos.
As bactérias responsáveis pela OMA apresentam um índice de remissão/cura espontânea de até 75%, e os vírus nunca precisam de tratamento específico. Quanto maior a idade da criança, maior a probabilidade de cura espontânea da OMA, sendo consequentemente menor a necessidade do uso de ATB.
O uso de ATB está relacionado a ocorrência frequente de dermatites de fralda (assadura) e diarréia que melhoram com o fim do uso da medicação.
Idade e Gravidade
- Sintomas severos: dor intensa ou febre maior que 39º por mais de 48 horas, toxemia ou dificuldade na reavaliação;
- Observação: aguardar de 48 à 72 horas e reavaliar o ouvido, caso haja sinais de melhora, antes do inicio do ATB;
- Para a utilização desse esquema de tratamento, o diagnóstico deve ser de certeza e não de “achômetro”.
Antibióticos
Utilizamos basicamente 3 etapas sequenciais na utilização dos ATB para OMA:
- Amoxicilina: melhor antibiótico para OMA e OMS (gotas diretamente no ouvido). Hoje em dia, a recomendação é a utilização de dose mais altas devido ao aumento da resistência bacteriana.
- Amoxicilina-Clavulanato: utilizado no caso de falha terapêutica na utilização da Amoxicilina (pelo menos 72 horas de uso sem melhora), no caso de conjuntivite concomitante ou uso de Amoxicilina nos 30 dias anteriores.
- Ceftriaxone: utilizado no caso de alergia documentada a amoxicilina (caso raro) ou falha terapêutica às medicações acima. Sempre recomendado a utilização de 3 doses (1 vez por dia por 3 dias). Essa medicação é utilizada em casos de doenças muito graves como a meningite e não deve ser utilizada sem necessidade.
Duração da Terapia
Como ainda não existe uma concordância sobre a duração, o bom senso sugere (somente se necessário):
- Menores de 2 anos: pelo menos 10 dias de antibióticos e analgésicos;
- Maiores de 2 anos: pelo menos 7 dias de antibióticos e analgésicos;
- Maiores de 6 anos: pelo menos 5-7 dias de antibióticos e analgésicos,
Complicações

As complicações geralmente são locais na OMA, sendo a mais comum:
- OMS: seguido de infecção no canal auricular ou orelha (secundário a OMS);
- Mastoidite: infecção do osso que fica atrás da orelha – como na imagem ao lado.
- Disseminação: doença pelo corpo.
Todas essas complicações são relativamente raras.
A OMA e principalmente a OME são causas de complicações – não preveníveis com uso de ATB. À longo prazo, a perda parcial da audição devido à alterações na capacidade da MT e dos Ossículos de detectarem alterações mais discretas nos sons.
Cirurgias
As cirurgias usualmente realizadas em quadros recorrentes de OMA são:
- Miringotomia e colocação de tubo de drenagem: sempre indicada no caso de recorrência da infecção;
- Cirurgia de Amígdala e Adenóide (carne esponjosa): não é recomendada, pois os estudos científicos demonstram pouca melhora nos quadros recorrentes relacionados a essas cirurgias, ou seja, devem ser feitas em casos muito específicos.
Prevenção
- Vacina contra Pneumococo ou de Pneumonia: essa vacina já está disponível há alguns anos no Brasil, sendo realizada com 2 e 4 meses, dando reforço aos 12 meses de vida;
- Vacina para Gripe: deve ser realizada anualmente devido a variação nos tipos de Influenza vírus causadores de gripes anualmente;
- Amamentação: por pelo menos 4-6 meses demonstra ser protetivo em relação a OMA e sua recorrência;
- Uso de Chupetas: o uso de chupetas após os 6 meses de vida aumenta o risco de OMA, mas devemos nos lembrar que nessa mesma faixa etária, o uso de chupetas é um fator protetor para a Síndrome da Morte Súbita do Lactente (SMSL);
- Mamar deitado: a realização de mamadas com a criança deitada – seja na mamadeira ou no seio – é um grande fator de risco para a ocorrência de OMA e aumenta também o risco de complicações como a OMS. O grande facilitador da mamadas deitadas é a união de: pais cansados e uma criança que ainda mama de madrugada-dorme na cama dos pais.
Espero ter ajudado e deixem seus comentários com dúvidas ou sugestões. Respondo assim que puder!
Dr. Christian Helfstein – Pediatra
Limeira – CRM/SP 119.947
Siglas
Analgésicos: remédios para a dor;
OMS: Otite Média Supurada = saída de secreção da orelha;
AOM-SOS: Acute Otitis Media – Severity of Symptons Scale;
OM: Otite Média;
OME: Otite Média com Efusão;
OMA: Otite Média Aguda;
ATB: Antibióticos;
OE: Otite Externa;
MEE: Efusão (líquido) na Orelha Média = sem causa definida;
TA: Tuba Auditiva;
MT: Membrana Timpânica;
SMLD [Síndrome da Morte Súbita do Lactente]: súbita e inesperada morte de um bebê menor de 1 ano que não pode ser explicada por achados na autópsia, histórico médico ou na investigação do local.
Olá dr, boa tarde
Meu filho de 1,4 anos vem de um resfriado desde segunda, com febre baixa. De quinta pra sexta teve uma noite muito agitada, mamava afoitamente entre choramingos. Na noite de sexta pra sábado ainda continuou com o sono alterado. Sexta a noite estava com 37,8 de febre. Sábado de manhã com 37,2. Só mediquei pois estava enjoado e sem apetite. Foi a última vez que mediquei. Não teve mais febre. Está espertinho.Mas hj amanheceu com um ouvido vazando. Há necessita ainda de antibiótico?
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Bom dia
Dá uma lida na página pediatriavirtual.com/vomito-com-remedio/
Lá tem muitas Informações sobre o assunto e vai te esclarecer sobre o assunto.
Abraços
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Meu filho tem 9 meses, teve febre por 5 dias levei ao médico estava com infecção no ouvido, médico receitou amoxilina clavulanato de potássio, dei 2 doses já é as 2 ele vomitou , isso depois de 2 horas que tomou, primeiro vomita o remédio depois vem uma água amarela, o que devo fazer, continuo com o remédio?
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Bom dia
A recorrência de infeções de ouvido não são comuns, geralmente o que ocorre é a presença de uma cicatriz na visualização da membrana do tímpano por alguns meses.
Como não existe febre ou dor ou saída de Secreção, a probabilidade de ser uma nova Infecção é baixa.
Em relação a medicação, o ideal é nunca repetir um mesmo antibióticos com intervalos menores de 30 dias. Se necessário, devemos trocar o antibiótico por outro.
Numa próxima oportunidade, se preferir uma resposta mais rápida, ou seja, no máximo em algumas horas, você pode contratar o serviço de telemedicina com valores variando de 10 e 40 reais, dependendo do período contratado. Respondo via Email ou Facebook/Messager … saiba mais clicando no https://pediatriavirtual.com/telemedicina/
Abraços
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Dr. ima otite media q volta no intervalo de 14 dias quer dizer q n foi tratada?Nesse caso pode ser usado o mesmo medicamento por igual periodo ou mais?Procuro um especialista pra investigar ou volto com a medicaçao? Ele tem 1 ano,nao chora e tbm nao percebi febre,mas apresenta todos os outros sintomas. Agradeço se puder me orientar.
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Bom dia
Provavelmente ela teve dor no ouvido devido a obstrução nasal, mas pode ser Infecção de ouvido.
Nessa idade se os sintomas melhoram em 48 HS não é necessário a utilização de antibióticos.
Abraços
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Dr minha filha chorou reclamando de dor de ouvindo numa tarde,dei paracetamol e passou,no outro dia ela não reclama mais de dor mas quando vou secar com a toalha após o banho ela reclama,teve febre baixa a noite,dorme e come bem e brinca normal,está resfriadinha com o nariz escorrendo e um pouco de tosse.
Se continuar assim,ela melhora sozinha?
Ela tem 2anos e 7meses e nunca teve nada no ouvido.
Abraços
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